Procurou-lhe o olhar e o que viu foi a sua sombra, a sombra de um olhar num rosto de prata.
Prendeu-lhe o rosto entre as mãos, mas ainda assim o olhar bailava e se escondia. Então zangou-se. E foi ríspido e áspero e rude quando lhe disse palavras e olhares que acusavam fraqueza. Ou cobardia.
Ela, despeitada, olhou-o enfim. Como se a rugosidade das palavras a magoasse. Ou lhe ferisse o orgulho. Olhou-o como quem queima.
Ele sorriu. Um sorriso que ressumava ternura perante o rosto daquela menina estranha e distante, que se cosia em extremos e ambiguidades.
- Que nunca se quebre o teu olhar de fada.
Estás imóvel e só, estacada diante de um espelho, nesse quarto a meia luz. Estás só e não estás. Há um silêncio que grita ecos de ausências que te não deixam ouvir a tua voz. Há um desfiladeiro de rostos pedra, rostos idos e as memórias são escarpas, agudas, acutilantes…
“Hoje, não há espaço para vós. Minha alma está cheia de mim. Recuai.”
Há a tua imagem num espelho e não há desafio ou nudez maior que essa de olhares o teu olhar. Alguém te ergue o rosto para que te olhes. Um dia, não precisarás que o façam, pois o teu olhar fugidio subirá à altura e olhará a perda de frente. Sozinha, hás-de aprender a amar cada traço desse rosto estranho e teu. Tu tens um rosto! Haverá privilégio maior? E os quartos que desconheces na tua alma em chamas abrir-se-ão um dia ao mundo. Floridos de muitas flores.
Há um mundo azul para lá do teu olhar de névoa… Há um mundo. Esse. Há uma alma. A tua. Há uma vida que não se repete e um desejo imenso de sentir, de conhecer, de ser.
“Se eu me quiser ler nos astros, quem me dirá que não consente?”
Elisabete
ResponderEliminarEste texto obrigava-me a uma reflexão intensa, mas não vou fazê-lo.O que escreveu é tão grande, que as palavras pequenas podem estragá-lo.
A metáfora do espelho e da procura mais íntima da personagem que nele se vê,cheia de inquietação e de certezas,de receio e de ousadia: “Hoje, não há espaço para vós. Minha alma está cheia de mim. Recuai”, ganham contornos de vivências profundas e verdadeiras que todos nós, pelo menos os que gostamos de alturas, experimentamos.
Faço força para que acredite nas palavras que criou"Há um mundo azul para lá do teu olhar de névoa… Há um mundo. Esse. Há uma alma. A tua. Há uma vida que não se repete e um desejo imenso de sentir, de conhecer, de ser.
“Se eu me quiser ler nos astros, quem me dirá que não consente?”
4 de Junho de
À medida que o tempo passa, cada vez me sinto mais grato por ter descoberto este espaço. A autora, apesar de jovem, tem uma profundidade que nem ela ainda conhece. Sente-lhe os contornos, mas parece assustar-se com o tamanho da sua visão.
ResponderEliminarElisabete, desejo, sinceramente, que os deuses sejam benfazejos com o seu respirar. Tem o mundo por limite, e não deve receá-lo. Vá, voe! Tem asas para isso!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarQuerida Elisabete (perdoa-me a apóstrofe, espero que não a consideres excessiva...):
ResponderEliminarPerguntaste-me há tempos por que não comentava o teu blog, os teus textos que digo admirar.
Pois tenho uma razão bem simples: há coisas que comento e faço-o com muito gosto! Umas publicamente: política, futebol, ideias, filosofias... Outras só na intimidade de quem mas dá a conhecer: atitudes, desejos, sentimentos, anseios... Outras ainda não comento de todo: é o caso da poesia!
Fica, porém, com esta certeza: o meu silêncio não é de modo algum sinal de desmerecimento, mas tão só de reverência perante o que me é transcendente, o que é maior do que eu!...
Beijinho